Discutir direitos humanos a partir
das pautas juvenis é um exercício tão desafiador quanto oportuno. Desafiador,
na medida em são temas complexos e de recente inserção nas agendas públicas de
nosso país. Oportuno, pois problematiza algumas violações de direitos e suscita
novas perspectivas.
Se observarmos que em nosso país a
escravidão deixou de existir há menos de 200 anos e que há menos de 100 as
mulheres não tinham direito ao voto, teremos uma pequena mostra do quanto essa
luta pela garantia de dignidade à pessoa humana é nova em nossa cultura. E
nesse sentido, é uma luta permanente, sempre em movimento e que perpassa nossas
inúmeras condições: gênero, etnia, orientação sexual, classe social... e também
a dimensão etária, nosso objeto de reflexão.
Para início de conversa, é
fundamental partirmos de uma concepção de juventude, que rejeita estereótipos e
enfatiza a diversidade dos saberes e dos fazeres juvenis, com a abordagem de
juventudes, sempre na sua forma plural. Existe nesse contexto o que chamamos de
condição juvenil, ou seja, um período determinado e transitório em que somos
considerados efetivamente jovens. No Brasil, a partir de acúmulos acadêmicos,
governamentais e sociais, compreende-se essa faixa dos 15 aos 29 anos. É
importante destacar que se trata de uma fase da vida, em que há sobreposição de
identidades etárias, de maneira que o ser jovem assumirá concomitância, ora com
o ser adolescente, ora com o ser adulto.
Definimos um pouco do que seriam
juventudes, contudo, tal consideração só se faz producente quando devidamente
apercebida e apropriada pelo conjunto da sociedade. Apesar de alguns avanços
nas agendas públicas, no âmbito do cotidiano da população brasileira, a
condição juvenil ainda é extremamente mal compreendida. Jovens são sempre
tratados como “pré-adultos” (conseqüentemente “pré-cidadãos”,
“pré-responsáveis”...), de forma que suas capacidades são permanentemente
desacreditadas. Vivemos numa sociedade em que ser jovem é sinônimo de ser
despreparado e desprovido da tão valorizada experiência (como se essa
dependesse exclusivamente da quantidade de tempo investido em algo e não de sua
qualidade). Um exemplo disso, é que para ser candidato a determinados cargos
eletivos, a lei exige idades específicas, definidas sem qualquer critério objetivo
de coerência (no mínimo 30 anos para ser governador e 35 para presidente da
república).
No outro extremo de abordagem,
jovem é sinônimo de beleza, saúde, vitalidade, disposição, prazer e tantos
outros predicados, que isolados em si mesmo, contribuem vigorosamente para
modelos banalizados de existência. Não que tentar ser bonito, saudável ou
sentir prazer, seja algo reprovável, mas viver exclusivamente para isso
(supostamente sem formações morais), contaminam nossas relações de indiferença
e insatisfação permanente, pois as coisas passam a valer mais do que as
pessoas. A partir desse pensamento, também se desenvolve uma prática comum em
relação às juventudes, sobretudo de classes menos abastadas, que é a de
exploração da mão de obra sob condições precárias. É óbvio que esse fator
atinge todas as faixas etárias, mas nos grupos juvenis é intensificado sob o
argumento da força e vigor natural desse grupo. Por exemplo, o que mais
observamos em ofertas de trabalhos de cunho operacional pesado é limitação em
relação à idade, como se o ser jovem justificasse o trabalhar mais.
Pensando então, o jovem em seus
recortes de classe, sobretudo as juventudes pobres, a estigmatização social
realiza papel ainda mais perverso, já que estes jovens, vítimas das mais
variadas formas de violência social (marginalização, preconceito, prostituição,
entre outras formas), são tratados como se fossem, naturalmente, incapazes de
atuar com independência e discernimento.
Isso sem citar os problemas somados
a outras condições sociais, como a questão de gênero, onde sabidamente são os
homens, em sua suprema maioria negros, que morrem, vitimas de um extermínio
situado na violência urbana. São também as jovens mulheres negras as principais
vitimas da exploração sexual e da mercantilização do corpo. São ainda os/as
jovens LGBTs que sofrem com a opressão, a falta de informação e o desserviço
prestado na rede pública, que discrimina de forma institucional a população de
transexuais e transgêneros.
Fica evidente o elevado número
violações sofridas pelas juventudes em nosso país, portanto é fundamental
direcionar a pauta dos direitos humanos para ações nesse recorte da população,
com respeito à diversidade de realidades juvenis e com efetivas práticas
de protagonismo juvenil, onde o jovem deixe de ser visto como um problema e
tenha acesso a ferramentas para se tornar solução de nossas várias
problemáticas sociais.
Discutir juventudes é discutir
direitos humanos e vice-versa, então lutemos para que o jovem ocupe na
sociedade o espaço que lhe é devido, qual seja o de um cidadão pleno,
respeitado em sua humanidade e considerado exclusivamente por suas
potencialidades.
Que todas e todos tenham assegurado
o direito de ser jovens, afinal, nosso tempo é agora.
Jorge Alberto é estudante de
jornalismo, educador social e candidato a vereador na cidade de São João de
Meriti.
Ludmila Queiroz é estudante de
marketing, conselheira de juventude de São João de Meriti e secretária de
combate ao racismo da Juventude do PT RJ.